Pessoas não são definidas pelo que acontece com elas, mas pelo que fazem
27/12/2025, 11:14:55Entre circunstâncias e escolhas, é a ação que revela o caráter de quem faz autodefesa, autosuficiência, e se autoempondera.
Há uma tentação confortável — e covarde — em definir pessoas pelos fatos que as alcançam. Pelo acidente, pela queda, pela injustiça sofrida, pela crise imposta, pelo golpe vindo de fora. É mais simples reduzir o ser humano a um episódio do que encarar a complexidade de suas escolhas. Mas essa simplificação não resiste ao teste mais básico da dignidade: ninguém é o que lhe acontece; cada um é, antes de tudo, o que faz diante do que lhe acontece.
A vida não pede permissão para impor desafios. Eles chegam sem aviso, sem justiça distributiva e sem manual de instruções. O que diferencia indivíduos não é a ausência de adversidade — isso não existe —, mas a resposta que se oferece a ela. Há quem transforme o revés em álibi permanente, vivendo de justificativas, culpas alheias e ressentimentos. E há quem faça do mesmo revés um ponto de virada, um exercício silencioso de caráter.
Caráter, aliás, não se revela nos dias de aplauso, mas nos momentos de escassez. É fácil parecer virtuoso quando tudo conspira a favor; difícil é manter a espinha ereta quando o vento sopra contra. A ação, e não a narrativa da vítima, é o verdadeiro termômetro moral. O que se faz quando ninguém está olhando? O que se escolhe quando o atalho é tentador e a consequência parece distante?
Confundir acontecimento com identidade é um erro conveniente para quem prefere a imobilidade. Se o sujeito é “produto das circunstâncias”, então nada lhe cabe senão reclamar. Mas se é agente de suas escolhas, a responsabilidade retorna — incômoda, exigente, inevitável. A maturidade começa quando se abandona a pergunta “por que comigo?” e se adota outra, bem menos confortável: “o que farei com isso?”.
Na política, no trabalho, nas relações e na vida pública, essa distinção é decisiva. Não faltam biografias cheias de tropeços que produziram homens e mulheres íntegros; assim como há histórias sem grandes traumas que geraram mediocridade e abuso. O fato bruto não santifica nem condena. A ação, sim.
Em tempos de vitimização performática e heroísmo de ocasião, convém lembrar: não somos a soma dos golpes recebidos, mas o saldo das decisões tomadas. O resto é desculpa bem escrita — e caráter mal resolvido.