A China e seu silêncio nas negociações de paz na Ucrânia
16/12/2025, 15:05:19O papel da China nas negociações de paz
Enquanto europeus e EUA se esforçam para chegar a um acordo de paz, Pequim mede seus interesses e mantém laços estreitos com Moscou.
Ao mesmo tempo em que deseja uma paz "aceitável para todas as partes", o regime liderado por Xi Jinping estreita laços militares e econômicos com a Rússia, liderada por Vladimir Putin. Em meio às negociações para uma paz duradoura na Ucrânia, que prosseguem em Berlim, ressurgiram os apelos para que a China desempenhe um papel mais construtivo para pôr fim à guerra. O ministro do Exterior da Alemanha, Johann Wadephul, está em visita à China e pediu ao regime chinês que use sua influência para pressionar a Rússia a negociar seriamente o fim da invasão da Ucrânia. "Se existe um país que exerce forte influência sobre a Rússia, esse país é a China", afirmou Wadephul após se reunir com o ministro chinês do Exterior, Wang Yi, em Pequim.
A China tem alegado neutralidade durante a guerra na Ucrânia, mas é acusada por países ocidentais de apoiar a Rússia ao comprar petróleo russo e exportar materiais de dupla utilização (que podem ser usados tanto para fins civis como militares). "É por isso [comércio com a Rússia] que a China tem muito cuidado para não ser vista como parte das negociações", enfatiza a professora Zsuzsa Anna Ferenczy, da Universidade Nacional Dong Hwa, de Taiwan, ressaltando os reiterados esforços de Pequim para projetar uma imagem de neutralidade. "Se essa definitivamente não é a percepção no Ocidente, pode ser a percepção no Sul Global", acrescenta.
Negociações entre Ucrânia e EUA
A China se mantém à parte. Três dias de negociações na Flórida entre autoridades ucranianas e dos Estados Unidos para debater o plano de paz apoiado pelo presidente Donald Trump aparentemente não produziram nenhum avanço na resolução das disputas territoriais entre a Ucrânia e a Rússia. O plano, que continha 28 pontos, se alinhava fortemente às exigências russas, o que forçaria a Ucrânia a ceder grandes partes de seu território e a desistir do ingresso na Otan.
O Kremlin também não aceitou o documento de 28 pontos, mas disse estar disposto a aceitá-lo como "a base para um acordo de paz final" e alertou contra mudanças significativas no texto em favor de Kiev.
O silêncio da China e suas consequências
Em meio a esses esforços, o regime em Pequim, como parceiro estratégico mais importante de Moscou, permaneceu relativamente silencioso. Na semana passada, o presidente chinês, Xi Jinping, resumiu a posição oficial do seu governo ao dizer, durante um encontro em Pequim com o presidente francês, Emmanuel Macron, que a China apoia "todos os esforços destinados a alcançar um acordo de paz justo, duradouro e vinculativo que seja aceitável para todas as partes".
Essa paz, entretanto, parece servir mais aos interesses da China. Em 2023, a China propôs um plano de paz que refletia como o país esperava que a guerra na Ucrânia terminasse, mas o documento foi criticado por não apresentar medidas específicas e por não condenar a agressão cometida pela Rússia. "A China está interessada no fim desta guerra, mas num fim que coloque a Rússia numa posição de vantagem e satisfaça o objetivo da Rússia, que é manter o território que conquistou", afirma Ferenczy. Tal acordo indicaria que "um regime autoritário pode violar o direito internacional e sair impune", acrescenta.
Implicações para a ordem global
Um acordo de paz que exija que a Ucrânia ceda território à Rússia pode ter grandes implicações para a ordem global e a segurança internacional. O regime em Pequim reivindica Taiwan, uma região autônoma e democrática, como parte de seu território e não descarta o uso da força militar para fazer valer essa posição. Desde que a Rússia iniciou a invasão da Ucrânia, tanto Taiwan quanto a China têm monitorado de perto o desenrolar do conflito.
"A norma dos últimos 70 anos nas relações internacionais é que não se devem fazer alterações territoriais pela força militar", explica o cientista político Raymond Kuo, do think tank de defesa Rand, dos EUA. "A grande questão é: essa norma está sendo quebrada?".
Cooperação militar entre China e Rússia
Moscou teria concordado em treinar e equipar um batalhão paraquedista chinês para uma possível invasão de Taiwan, conforme noticiado inicialmente pelo site The Kyiv Independent. Em paralelo às demonstrações de força militar pela China, Taiwan enfrenta ainda fortes dificuldades diplomáticas, com sua soberania não sendo reconhecida pela maioria dos governos devido à pressão, por parte de Pequim, contra o estabelecimento de relações oficiais com Taipei. "O acordo [para a paz na Ucrânia] tem potencial para aumentar as dificuldades" que Taiwan já enfrenta, afirma Kuo.
Apesar da pressão contrária por parte dos governos ocidentais, a cooperação da China com a Rússia só se aprofundou. À medida que passou a enfrentar um isolamento político e econômico maior devido à guerra na Ucrânia, a Rússia passou a se apoiar cada vez mais na China para o comércio, e os laços militares entre os dois países se expandiram. Durante a visita do ministro chinês do Exterior, Wang Yi, a Moscou, as duas nações afirmaram ter chegado a um amplo consenso sobre uma série de questões.
O que se percebe, quatro anos após o início da guerra, é que a China não tem interesse em enfraquecer seu apoio à Rússia, pois isso serve aos interesses estratégicos de Pequim. A pressão que a guerra na Ucrânia exerce sobre a Europa e os EUA beneficia a China ao minar a democracia como sistema de governo e uma ordem mundial liderada pelo Ocidente.
Embora os países-membros da UE tenham abordagens diferentes em relação a Pequim, espera-se que o bloco se mantenha firme no apoio à Ucrânia para garantir um acordo que ofereça garantias de segurança a longo prazo aos ucranianos.