Mercado de carbono e a preservação da Amazônia em debate

Mercado de carbono e a preservação da Amazônia em debate

O futuro da Amazônia e o mercado de carbono

O Brasil está na contagem regressiva para sediar a 30ª Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP30), que acontecerá entre os dias 10 e 21 de novembro em Belém. Com os avanços das políticas climáticas pelo mundo, um dos temas que deve ser discutido na conferência é o mercado de carbono, uma das estratégias mais importantes para reduzir as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE).

O mercado de carbono é um sistema econômico que permite a compra e venda de créditos de carbono. Com isso, empresas ou países que possuem níveis de emissão de Gases de Efeito Estufa muito altos podem comprar créditos para compensar suas emissões. Dessa forma, quanto menos um país ou organização polui, mais créditos consegue gerar.

Um crédito de carbono representa uma tonelada de carbono que deixou de ser lançada na atmosfera. Esses créditos podem ser gerados de algumas formas diferentes: por meio da substituição de combustíveis poluidores por renováveis, ou por meio de projetos de reflorestamento e recuperação de áreas degradadas, que promovem o aumento da cobertura vegetal e a capacidade do solo de armazenar carbono, por exemplo.

Legislação e a valorização da Amazônia

Em 2024, foi instituída a lei n° 15.042, que criou o Sistema Brasileiro do Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), que regula o mercado de carbono no Brasil. Dessa forma, o país passou a fazer parte do grupo de países que possui um sistema de precificação de carbono.

Com expectativa de reunir mais de 60 mil participantes, a COP30 deve colocar a Amazônia em evidência no cenário do comércio global de carbono. Uma das propostas do Brasil - que abriga cerca de 60% do território total da floresta - para a COP, é a criação da Coalizão Aberta para Integração dos Mercados de Carbono. A iniciativa, que é liderada pelo Ministério da Fazenda, busca harmonizar padrões e conectar diferentes sistemas do comércio de créditos de carbono já existentes, com o objetivo de gerar transparência, previsibilidade e liquidez no setor, além de acelerar a descarbonização das economias dos países membros.

Riscos e oportunidades na regulamentação

Mas será que esse mercado pode transformar a Amazônia em uma mercadoria, vendida em pedaços? Mais do que uma ferramenta para promover o desenvolvimento sustentável, o mercado de carbono movimenta muito dinheiro e está na mira de empresários e de grandes organizações. De acordo com um estudo do Earth Innovation Institute (EII), os estados brasileiros da Amazônia legal têm potencial para receber entre 10,8 bilhões e 21,6 bilhões de dólares - R$ 58 bilhões e R$ 116 bilhões, respectivamente, na cotação atual - e da venda de créditos de carbono até 2030.

O Carbon Credits define a Amazônia como um "reservatório vital de carbono", que armazena cerca de 56,8 bilhões de toneladas métricas de carbono acima do solo. Segundo o site, só o Brasil concentra mais de 32 bilhões de toneladas métricas desse total, o que equivale a mais de uma vez e meia as emissões globais anuais de CO2 registradas em 2023.

A perspectiva de Fabiano Nagamatsu

Em entrevista ao Portal iG, Fabiano Nagamatsu, CEO da Osten Moove, Aceleradora Venture Studio Capital, empresa focada no desenvolvimento de inovação e tecnologia, explicou como o mercado de carbono pode impactar a floresta, os povos que vivem nela e como a COP30 pode influenciar os interesses econômicos e ambientais na região.

Portal iG: Como o lobby corporativo tem influenciado as discussões sobre o mercado de carbono no Brasil?
Fabiano Nagamatsu: O lobby corporativo tem exercido uma influência significativa nas discussões sobre o mercado do carbono no Brasil, principalmente no contexto da COP30. Muitas vezes, direcionando as políticas e regulações para favorecer interesses de grandes empresas e setores econômicos específicos. Essa influência pode, assim, resultar em regulações que priorizam a lucratividade de grandes players. Às vezes, em detrimento de benefícios reais para as comunidades.

Portal iG: Há risco de que o sistema favoreça grandes empresas e deixe de gerar benefícios reais para quem vive na floresta?
Fabiano Nagamatsu: Sim, há riscos de que o sistema de mercado de carbono - se não for bem regulamentado - favoreça sempre as grandes corporações e facilite a perpetuação de práticas que não são boas para a conservação genuína da floresta, principalmente. Isso pode ocorrer se os mecanismos de compensação forem mal definidos. Então, por exemplo, se a questão do crédito de carbono ou sequestro de carbono não forem bem definidos, possivelmente vão beneficiar só os interesses das grandes empresas.

Portal iG: De que maneira a regulamentação pode garantir transparência e participação das comunidades locais?
Fabiano Nagamatsu: A regulamentação pode garantir maior transparência e participação das comunidades locais através de mecanismos inclusivos, como fazer uma consulta pública, conselhos de participação, de representação de população tradicional, dos povos indígenas, da sociedade local que mora ali. É fundamental que os benefícios do mercado de carbono sejam distribuídos de forma justa para a comunidade que tem a voz ativa naquela região.

Portal iG: Quais os possíveis impactos do mercado de carbono sobre a conservação da Amazônia?
Fabiano Nagamatsu: Os possíveis impactos dependem de como é implementado. Se a regulamentação está bem ajustada, pode incentivar projetos de conservação, restauração e manejo sustentável, por exemplo, gerando recursos para garantir a proteção das florestas.

Portal iG: Que papel a COP30 pode desempenhar para equilibrar interesses econômicos e ambientais na região?
Fabiano Nagamatsu: A COP30 pode estabelecer acordos e compromissos que priorizem ações concretas de conservação, proteção da comunidade e respeito aos direitos dos povos indígenas, - o que não vem acontecendo, e deve ser uma das principais pautas a serem colocadas. Além disso, a oportunidade de fortalecer os compromissos internacionais de financiamento, monitoramento, transparência, visando impulsionar uma implementação mais justa e efetiva do mercado de carbono no Brasil e na Amazônia. Então, isso deve acontecer, porém, não sei, se, devido ao lobby, questões políticas e até mesmo de ideologia, isso aconteça efetivamente.