A política como causa e efeito das divisões polarizadas
23/10/2025, 08:46:54Quando o poder alimenta o conflito e o conflito alimenta o poder
A política, em sua essência, deveria ser o exercício da convivência civilizada, o espaço do diálogo, do convencimento e do consenso possível. No entanto, nas últimas décadas, transformou-se num campo de batalha ideológica, onde as trincheiras são erguidas antes mesmo de qualquer debate começar. O que era instrumento de união passou a ser a própria causa da divisão — e, paradoxalmente, o seu efeito mais destrutivo.
Vivemos uma era em que a política deixou de ser o meio para resolver os problemas coletivos e se tornou o combustível das polarizações. Esquerda e direita, “nós” e “eles”, patriotas e traidores, moralistas e libertinos — os rótulos se multiplicam e substituem os argumentos. Essa fragmentação social não nasce do acaso: é cuidadosamente cultivada pelos que lucram com o caos, pois um povo dividido é mais fácil de conduzir do que um povo esclarecido.
A polarização não é apenas um reflexo das redes sociais, mas um projeto de poder. A indignação é estimulada como ferramenta de manipulação. O eleitor é levado a acreditar que seu inimigo é o vizinho que pensa diferente, e não o sistema que se alimenta dessa desunião. Assim, o ódio se institucionaliza, e a política se converte em espetáculo de gladiadores — cada um defendendo sua bandeira, sem perceber que o coliseu é o mesmo.
Quando o debate se torna guerra, a razão se cala. E nesse silêncio, prosperam os oportunistas, que se apresentam como salvadores em meio à confusão que eles próprios ajudaram a criar. A política, portanto, torna-se tanto a causa da polarização quanto o efeito dela. É um círculo vicioso: quanto mais as divisões crescem, mais se radicalizam os discursos; quanto mais os discursos se radicalizam, mais a sociedade se divide.
Romper esse ciclo exige maturidade coletiva. Não se trata de apagar as diferenças — elas são legítimas e necessárias —, mas de impedir que se transformem em abismos. A democracia não sobrevive de unanimidades, mas de convivências. Quando o diálogo é substituído pelo insulto, e a escuta pelo julgamento, a política deixa de servir ao povo e passa a servi-lo de bandeja aos interesses do poder.
A verdadeira política é a arte do encontro, não da exclusão. Enquanto a sociedade insistir em dividir o mundo entre heróis e vilões, continuará presa a um roteiro escrito por quem sabe: o caos é o melhor cenário para quem governa sem ser questionado.
Porque, no fim das contas, a polarização não é o resultado da política — é o seu disfarce mais eficiente.