Medo da polícia anti-imigração afeta rotina de brasileiros

Medo da polícia anti-imigração afeta rotina de brasileiros

O temor entre imigrantes brasileiros

Com a ameaça de deportações e a atuação mais ampla do ICE, o número de brasileiros que evitam sair de casa e mudam seus hábitos nos EUA tem crescido. O retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos reacendeu o temor entre os imigrantes em situação irregular. Em meio a operações do Serviço de Imigração e Controle de Aduanas (ICE), o comércio local está esvaziado, a queda no consumo é evidente e a escassez de mão de obra em setores essenciais, como limpeza, construção civil e entregas, tem aumentado.

Mudanças rigorosas na política migratória

Desde o início do seu segundo mandato, Trump tem implementado uma série de mudanças rígidas na política migratória, focando principalmente na deportação de imigrantes indocumentados. Até novembro de 2024, de acordo com o Departamento de Segurança Interna dos EUA, pelo menos 38.677 brasileiros estavam aguardando deportação, representando cerca de 2,7% dos 1,45 milhão de estrangeiros com ordens finais de saída do país.

A comunidade brasileira nos Estados Unidos

A comunidade brasileira é uma das maiores da América Latina fora do Brasil, com estimativas de mais de 1,8 milhão de brasileiros vivendo nos EUA, concentrados em estados como Flórida, Massachusetts, Nova Jersey e Califórnia. Muitos estão empregados em setores de limpeza, construção civil, cuidados domiciliares e alimentação.

Aumento da demanda por apoio

Com o aperto das medidas migratórias, várias organizações de apoio relataram um aumento na demanda por orientação legal, abrigo temporário e assistência psicológica. A ONG Mantena, em Newark (NJ), indicou um crescimento no número de pessoas procurado renovação de documentos brasileiros e se preparando para um possível retorno ao Brasil.

O clima de incerteza

“Tem dias em que a gente também não sabe o que fazer”, afirma Rodrigo Godoi, diretor da Mantena, ressaltando que esse clima de incerteza também afeta a equipe da organização. “Tentamos manter a calma e transmitir segurança para os outros, mas também ficamos sem saber para onde ir.”

O impacto na violência doméstica

O cenário também impacta os casos de violência doméstica, com muitas vítimas tendo medo de denunciar. “Passamos anos tentando romper o tabu para que as mulheres pudessem falar sobre isso. Agora, se denunciam e são deportadas logo em seguida, o ciclo de silêncio volta”, explica Godoi.

O aumento da tensão

A advogada Flávia Santos Lloyd, com mais de 20 anos de atuação na área migratória, afirma que o momento atual é o mais tenso de sua carreira. “Tenho clientes com cidadania americana com medo de viajar. Pessoas com direito à naturalização que estão desistindo. Nunca vi nada assim.”

A sensação de terror

O pânico afeta até os processos legais. “Há casos em que a pessoa vai à audiência de deportação ou ao check-in e é presa na saída. Isso criou um clima de terror. Mesmo quem quer fazer tudo certo, agora tem medo”, explica a advogada.

A mudança no comércio

O bairro Ironbound, em Newark (NJ), é um epicentro dessas mudanças. Com a forte presença de imigrantes brasileiros e latinos, há uma retração visível no comércio e na circulação. João de Souza, um mineiro que comanda uma padaria na região, observa: “O movimento caiu mais da metade. Caiu muito. Não sei se é medo, se é outra coisa.”

Adaptação e perda de negócios

Douglas Barbosa, cabeleireiro que vive nos EUA há 13 anos, notou que muitos profissionais estão optando por trabalhar de forma clandestina. “Muita gente prefere atender escondido, em casa ou em salinhas. Não é por dinheiro, é por medo. As pessoas têm receio de ficar visíveis”, conta ele.

Informações e insegurança

Leonardo de Oliveira, que comanda uma distribuidora de bebidas, destaca a queda no poder de compra dos clientes. “As vendas caíram cerca de 20% a 25% em relação a três meses atrás. O movimento aumentou, mas o que caiu foi a capacidade de consumo”, explica.

Reflexões sobre retornar ao Brasil

A diarista Patrícia, que não quer ter seu nome verdadeiro divulgado, menciona que, apesar de não ter sofrido impactos diretos, percebe a tensão crescente. “A principal avenida do bairro, antes bem movimentada, está vazia. Tem loja fechando.”

A sensação de medo atinge até as crianças

Ela relata que sua filha, em um momento de desespero, disse: “Mãe, não quero que o ICE prenda a gente.” Isso reflete o clima de receio que permeia até as crianças que estão inseridas nesse contexto.

A política e suas consequências

Embora o cenário de medo persista, parte da comunidade ainda apoia Trump, culpando o governo Biden pela situação atual e associando a crise à suposta abertura do país para imigrantes. “Esse terrorismo psicológico uma hora tem que passar”, conclui Douglas Barbosa, “só não sabemos quando.”