Se a Constituição é Ferida, a Democracia Já Está Morta

Não se entende como parte da população barsileira - os bolsonaristas - querem o regime de governo. Se democrático ou ditatorial?

Se a Constituição é Ferida, a Democracia Já Está Morta

Em tempos de instabilidade política e disputas narrativas, uma pergunta inquietante ecoa nos corredores do poder e nos debates públicos: se cumprir a Constituição é ferir a democracia, o que fazer então?

A Constituição é o alicerce do Estado democrático de direito. É ela quem organiza os poderes, estabelece direitos, impõe limites e assegura que a vontade da maioria não esmague as garantias da minoria. No entanto, nos últimos anos, tem-se assistido a um fenômeno curioso – e perigoso: cumprir a Constituição passou a ser visto, por alguns, como um ato de afronta à democracia.

Esse paradoxo revela uma distorção proposital da linguagem. Democracia, para os que se ressentem das limitações constitucionais, não é mais o regime de leis, mas sim o regime da conveniência. O que não interessa ao grupo no poder ou à narrativa dominante, é rotulado de “antidemocrático”, ainda que esteja rigorosamente dentro dos marcos constitucionais.

O perigo dessa inversão é claro: a democracia se esvazia de seu conteúdo jurídico e passa a ser um rótulo elástico, manipulado conforme as circunstâncias. A lei cede lugar à retórica; a Constituição, ao casuísmo. O resultado é um Estado de exceção permanente, mascarado sob o discurso de defesa da própria democracia.

Mas voltemos à pergunta inicial: se cumprir a Constituição é ferir a democracia, o que fazer? A resposta talvez esteja no resgate do óbvio: democracia não é apenas voto, nem apenas vontade da maioria; democracia é a convivência sob regras estáveis, escritas e respeitadas. A Constituição é, portanto, o maior pacto democrático já firmado por uma nação.

A saída não está em reinterpretar a Constituição ao sabor dos ventos políticos, mas em reforçar sua centralidade. Quando ela limita, não é para calar a sociedade, mas para proteger todos de um poder absoluto. Quando ela impõe freios, não é para travar o futuro, mas para impedir retrocessos.

Se há falhas no texto constitucional – e elas existem – o caminho legítimo é o da emenda constitucional, pelo processo legislativo previsto. Fora disso, qualquer atalho pode parecer ágil, mas abre espaço para arbitrariedades.

Em resumo: se cumprir a Constituição passou a ser visto como um problema, o erro não está na Constituição, mas em quem a interpreta de má-fé. A democracia, ao contrário do que dizem os arautos do relativismo político, não nasce do improviso. Ela só sobrevive quando a regra é maior que o governante, e quando o poder respeita os limites que a sociedade, soberanamente, escreveu em sua Carta Magna.

Creditos: Professor Raul Rodrigues