Voto de Luiz Fux abre espaço para defesa de Bolsonaro
10/09/2025, 15:32:17O contexto do julgamento
O ministro do STF Luiz Fux
Um dia antes de declarar seu voto pela absolvição dos réus na ação penal da trama golpista, Luiz Fux já havia indicado que não queria interrupção durante sua fala que na reabertura do julgamento nesta quarta-feira (10). O recado era claro: ele não queria ouvir qualquer invertida de colegas como Alexandre de Moraes, que certamente lembraria o ministro de que questões como a competência da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal já haviam sido discutidas (e resolvidas) no recebimento da denúncia, em março.
Discordâncias e repercussões
Naquele momento Fux teve espaço para manifestar as discordâncias dos outros quatro integrantes da Turma. Para ele, o julgamento de Jair Bolsonaro (PL) e de outros sete réus do chamado núcleo 1 da trama golpista deveria ocorrer ou no Plenário, com os 11 ministros da Corte a postos, ou na primeira instância, já que a maioria dos acusados não tem prerrogativa de foro.
Fux tinha também outras discordâncias. Mesmo mantendo a delação, ele apontou omissões importantes nos depoimentos de Mauro Cid, que guiou toda a denúncia. E era contra também as medidas cautelares sobre Jair Bolsonaro, como o uso da tornozeleira eletrônica e a proibição de usar as redes sociais.
A lembrança de Flávio Dino
Flávio Dino tanto sabia que Fux poderia causar, durante a leitura de seu voto, que fez questão de lembrar o que ele dizia, num passado não muito distante, sobre pessoas que atentam contra o Estado democrático de Direito: elas não deveriam receber perdão. Fux, que já condenou golpistas do 8 de janeiro sem apelação, dizia isso na análise do indulto do deputado Daniel Silveira, antigo integrante da tropa de choque bolsonarista nos ataques ao Supremo.
“Vai mudar de ideia agora?” foi o recado subliminar. Fux foi lá, no dia seguinte, condenou Bolsonaro e companhia, mas abriu o voto declarando que a Primeira Turma era incompetente para julgar o caso e que o processo deveria ser anulado. Era tudo o que os advogados dos réus queriam: todos tentavam ganhar tempo e tirar a ação da “Turma do Moraes”, independentemente do mérito da acusação. Seja qual for o resultado, ele não terá sido unânime – o que permite contestações daqui em diante.
Paralelos com o julgamento de Lula
Caso parecido aconteceu com o presidente Lula (PT), quando foi julgado na 13ª Vara de Curitiba, de Sergio Moro. Em 2021, o STF anulou as condenações contra ele na Lava Jato dizendo que aquele não era o foro adequado para o julgamento. Fux foi um dos que votou pela manutenção do caso em Curitiba.
Nessa ocasião, Fux age como jogador que protesta contra uma partida no gramado sintético. Os outros atletas chegam à conclusão de que dá, sim, para jogar em gramado sintético. Mas o opositor mantém a posição, mesmo com voto vencido. Ele entra em campo, joga, faz lá seu gol e, na hora de comentar o resultado, diz que ele foi influenciado pelo gramado sintético. E coloca sob dúvida o resultado da própria partida.
Implicações jurídicas
No campo jurídico – e também político, onde é gestado um plano de anistia – a divergência de Fux é um prato cheio para as defesas dos acusados entrarem com recursos e mais recursos agarrados no argumento de um dos integrantes da Corte.
Não foi a única brecha. Fux concordou com os advogados que, nas alegações finais, manifestaram que houve cerceamento de defesa e não tiveram tempo de ler todos os documentos que balizaram as acusações contra os clientes. Mais: em seu voto, deu a entender que os colegas banalizaram o conceito de “crime organizado”, o termo mais citado por Moraes na véspera. Ele cutucou o relator ao dizer que um juiz deveria se guiar com “serenidade, equidistância e imparcialidade no exame dos fatos e das provas”.
“A partir do momento em que o juiz se faz mais severo do que a lei, ele se torna injusto, pois aumenta novo castigo ao que já está prefixado. Nenhum magistrado pode, mesmo sob pretexto do bem público, aumentar a pena prenunciada pelo crime de um cidadão”, disse ele, olhando para Moraes, mas sem citar nomes para, segundo ele, não soar deselegante. Foi a indireta mais direta da História do Supremo.