EUA cancelam evento militar com Brasil e alertam Defesa

EUA cancelam evento militar com Brasil e alertam Defesa

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Os Estados Unidos cancelaram um evento que estava sendo organizado com a FAB (Força Aérea Brasileira) e sinalizaram que provavelmente também ficarão de fora do principal exercício da Marinha, a Operação Formosa.

Os sinais de distanciamento de Washington preocupam o Ministério da Defesa, que tenta proteger o setor de cooperação militar estratégica da crise político-econômica que surgiu entre Brasil e EUA durante o governo de Donald Trump.
O Southcom (Comando Sul dos EUA) planejava realizar a edição de 2025 da Conferência Espacial das Américas junto com a FAB. A conferência, que também reuniria outros países do continente, estava programada para ocorrer de 29 a 31 de julho em Brasília.
"O evento foi cancelado pela decisão dos Estados Unidos no dia 23 de julho", informou a FAB em um comunicado.
Contatado, o Comando Sul dos EUA não respondeu até o momento da publicação desta reportagem.
Esta seria a quarta edição do encontro. No ano passado, o evento ocorreu em Miami, nos EUA, e contou com a presença de dez países convidados: Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Equador, México, Paraguai, Peru e Uruguai.
De acordo com o site do Southcom, o principal objetivo da conferência anual é promover a cooperação no setor espacial - não apenas em sua dimensão militar, mas também nas áreas econômica, de telecomunicações, pesquisa e navegação.
A Folha conversou com diferentes indivíduos cientes da organização do encontro. Embora os EUA não tenham explicado o motivo do cancelamento, a decisão tem sido interpretada como mais um reflexo da crise entre o governo Lula (PT) e Trump.
O presidente dos EUA acusou o governo Lula e o STF (Supremo Tribunal Federal) de promover uma "caça às bruxas" contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que é réu no caso do golpe. Seu governo também impôs sanções financeiras ao ministro do STF, Alexandre de Moraes, além de revogar vistos para o magistrado e outros membros do tribunal, assim como para funcionários que trabalharam no programa Mais Médicos.
No âmbito econômico, Trump impôs uma sobretaxa de 50% sobre uma gama de produtos brasileiros. Canais de diálogo com autoridades-chave em Washington estão bloqueados, segundo Lula e seus ministros.
Os desdobramentos da crise entre os países devem afetar também a Operação Formosa – o principal exercício da Marinha no Brasil.
A Marinha mobiliza cerca de 2.000 militares para o exercício deste ano, com mais de 100 veículos e oito helicópteros transportados para Formosa (GO).
Desde 2023, os fuzileiros navais dos EUA enviaram uma parte das tropas para participar do exercício militar. No ano passado, a delegação consistiu em 56 militares dos EUA. Foi a primeira vez que tropas da China e dos EUA participaram juntas da operação.
Três fontes cientes dos preparativos da operação disseram à Folha que os fuzileiros navais dos EUA não responderam ao convite da Marinha Brasileira para participar da Operação Formosa. O Corpo de Fuzileiros da China também afirmou que não participará do exercício militar.
Os norte-americanos têm participado da operação no cerrado brasileiro há cerca de dez anos. Eles participaram em nível de observador e aumentaram a cooperação há dois anos. Consultada, a Marinha Brasileira não respondeu.
Há resistência dentro do governo Lula à participação de tropas americanas em Formosa. Uma facção dos conselheiros do presidente comunicou ao Ministério da Defesa que era inadequado realizar exercícios com tropas de uma nação que impõe sanções ao Brasil.
A avaliação feita dentro da Marinha é que os sinais de distanciamento dos EUA também estão relacionados ao fortalecimento dos laços militares entre Brasil e China.
Os chineses começaram a enviar tropas para exercícios militares conjuntos no Brasil no ano passado. Pelo lado brasileiro, o governo decidiu aumentar sua representação militar em Pequim, enviando, pela primeira vez, um oficial-general para o cargo de adido militar na embaixada.
Os sinais enviados pelos americanos através do cancelamento de eventos e a potencial retirada de tropas dos exercícios militares não representam uma ruptura na cooperação militar entre os dois países, afirmaram três generais em condição de anonimato.
Como exemplo, citou-se que as Forças Armadas dos EUA enviaram aviões de carga para Campo Grande (MS) no final de julho para o Exercício Conjunto Tápio, que foca em simulações de guerra irregular, guerra eletrônica e missões de paz.
O Exército também segue avançando para realizar a Operação Core 2025 em novembro. Este é um exercício militar conjunto entre Brasil e Estados Unidos, focado na padronização de procedimentos entre as forças em operações conjuntas e missões de manutenção da paz. Até o momento, não há problemas no planejamento, de acordo com membros do Ministério da Defesa.
As expressões de insatisfação dos americanos ocorrem meses após a primeira visita ao Brasil do comandante do Comando Sul dos EUA, almirante Alvin Holsey. O encontro com oficiais militares brasileiros causou desconforto e cancelou compromissos.
Os Estados Unidos solicitaram que Holsey visitasse uma base do Exército em Rio Branco, Acre. Os generais brasileiros consideraram estranho solicitar uma visita específica a essa base, que normalmente não recebe autoridades estrangeiras. Houve uma tentativa de redirecionar a agenda para Manaus, mas os americanos não aceitaram – o que limitou os compromissos de Holsey a Brasília.