Oposição discute anistia para envolvidos em 8 de janeiro

Oposição discute anistia para envolvidos em 8 de janeiro

Oposição mobiliza apoio para anistia

Os aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no Congresso Nacional têm se mobilizado em torno da ideia de conceder anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023. O problema é que, somente na Câmara dos Deputados, são pelo menos 11 projetos de lei que tratam da questão, com escopo, limites e termos diferentes. No Senado, são pelo menos mais quatro. Na volta do recesso parlamentar, nesta semana, a oposição se organizou e obstruiu a retomada dos trabalhos no Congresso, ocupando as Mesas Diretoras e exigindo a inclusão na pauta da proposta de anistia, entre outras questões relacionadas ao processo do Supremo Tribunal Federal (STF) em que Bolsonaro virou réu e aguarda julgamento.

Debates e propostas em tramitação

Foram dois dias defendendo, além da anistia, a votação da PEC do fim do foro privilegiado, a abertura de processo de impeachment do ministro do STF, Alexandre de Moraes, e ainda protestando contra a prisão domiciliar do ex-presidente, decretada na última segunda-feira (4). Tanto a anistia quanto o impeachment do magistrado são as apostas da oposição para tentar salvar Bolsonaro do inquérito que investiga a suposta trama golpista e, consequentemente, livrá-lo da prisão. Mas vai ser preciso muita negociação para se chegar a um consenso.

Na Câmara, o projeto de lei mais avançado é o 2.858/2022, de autoria do deputado Vitor Hugo (PL), que prevê perdão amplo aos envolvidos no 8 de janeiro. Por já ter sido analisado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde teve parecer favorável em setembro do ano passado, esse PL tem pelo menos oito projetos de lei que tratam da anistia anexados a ele, ou seja, tramitam em conjunto.

Escopo da proposta de anistia

Segundo o artigo 1º do PL 2.858/2022, "ficam anistiados todos os que participaram de manifestações com motivação política e/ou eleitoral, ou as apoiaram, por quaisquer meios, inclusive contribuições, doações, apoio logístico ou prestação de serviços e publicações em mídias sociais e plataformas, entre o dia 08 de janeiro de 2023 e o dia de entrada em vigor desta Lei." Esta proposta inclui os participantes dos bloqueios rodoviários, bem como dos acampamentos montados em frente aos quartéis cobrando a intervenção das Forças Armadas sobre o resultado eleitoral.

Dificuldades e desafios na aprovação

Durante os debates do PL na CCJ, seu relator, deputado Rodrigo Valadares (União), afirmou que o projeto não incluiria acusações contra Bolsonaro ou outras lideranças políticas, restringindo-se apenas aos manifestantes. Há um requerimento de urgência para levar o projeto ao Plenário da Câmara, mas a pauta ainda depende de decisão do presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos). Nesta quinta-feira (7), desmentindo informações divulgadas por líderes da oposição, Motta negou que a retomada dos trabalhos no Plenário, após o motim dos bolsonaristas, tenha sido negociada em troca do compromisso dele de pautar o projeto de lei que prevê anistia.

Outro projeto que tramita na Câmara, o mais abrangente, é de autoria do deputado Alexandre Ramagem (PL), que também é réu no mesmo processo de Bolsonaro. É o projeto de lei 5793/2023, também assinado por Mario Frias (PL), André Fernandes (PL), Mauricio Marcon (Podemos) e Marco Feliciano (PL), que altera no Código Penal os crimes contra o Estado de Direito, exigindo que os crimes em questão envolvam violência contra pessoa ou grave ameaça. Também impede o uso da teoria do crime multitudinário, exige individualização da conduta e concede anistia para quatro tipos penais: incitação ao crime, associação criminosa, tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. A medida prevê ainda a libertação de todos os presos com base nesses crimes.

Propostas e perspectivas futuras

Outro projeto de lei relevante é o 4485/2024, do deputado Marcos Pollon (PL). Ele extingue, para atos cometidos nos dias 8 e 9 de janeiro de 2023, a punibilidade de condenados por associação criminosa armada, tentativa de golpe de Estado, abolição violenta da ordem democrática e incitação ao crime. Também determina a anulação dos registros criminais relativos a esses delitos. Além deste, tramita também o projeto de lei 5643/2023 de autoria do deputado Cabo Gilberto Silva (PL), que também pode afetar o processo contra Bolsonaro. Ele concede anistia penal a "todos que tenham sido ou venham a ser acusados ou condenados" em razão dos ataques de 8 de janeiro por abolição violenta do Estado Democrático de Direito e tentativa de golpe de Estado, excluindo outros crimes eventualmente imputados aos manifestantes.

As outras propostas, como os projetos 2162/2023, de Marcelo Crivella (Republicanos-R); 3312/2023, de Adilson Barroso (PL), e 1216/2024, de Hélio Lopes (PL), já trabalham com objetivos mais restritos, com menor potencial de atingir diretamente Jair Bolsonaro ou outros atores políticos. Estes PLs estão anexados ao PL 2858/2022 e tramitam em conjunto. Já no Senado, existem ao menos outros quatro projetos defendendo anistia para o 8 de janeiro. A proposta mais abrangente é do senador Marcio Bittar (União). O projeto de lei 1068/2024 concede anistia a todos os crimes e contravenções penais ligados aos protestos, restabelece direitos políticos de inelegíveis e determina a reintegração de eventuais mandatos perdidos por atos relacionados às eleições de 2022. O texto também impede novas cassações com base nas mesmas condutas.

Conclusão

Com tantos projetos em tramitação tratando da anistia, na Câmara e no Senado, a aprovação de uma proposta final não deverá ser nada simples. Essa é a avaliação do professor Fernando Bentes, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Doutor em Direito Constitucional. Em entrevista ao Portal iG, ele explicou a dificuldade de se reunir os vários projetos de lei sobre uma mesma questão em uma única proposta, como o que está ocorrendo em relação à proposta de anistia.

"Dentre vários projetos de leis que existem, é feita uma composição política entre os partidos, entre o colégio de líderes, que reúne os líderes dos partidos mais importantes da Câmara ou do Senado. E existe uma união dessas propostas, até que saia um projeto de lei final, com mais aderência de todos os parlamentares. Aí, sim, o PL consegue seguir seu curso normal, seja na comissão temática, na CCJ e depois no Plenário", detalha. E é justamente neste acordo que precisará ser firmado entre os parlamentares, que está o grande obstáculo.