Baleia franca e resgate: a polêmica com o Ibama
17/07/2025, 08:53:39A baleia presa e o ato de coragem
A iniciativa de um homem, até agora não identificado, diante de uma baleia-franca que estava com uma rede de pesca presa à cabeça, no litoral de Santa Catarina, viralizou nas redes sociais. O caso também desencadeou uma série de críticas ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que acompanhou o caso, mas decidiu não agir.
Para entender melhor o que aconteceu, o Portal iG questionou o Ibama a respeito do protocolo que foi seguido pelo órgão federal, diante da situação do animal, que estava acompanhado de seu filhote.
A ação de resgate
A baleia-franca estava acompanhada de um filhote e foi vista pela primeira vez na quinta-feira (10), na Praia da Pinheira, em Palhoça (SC), onde permaneceu por três dias, com uma rede presa na cabeça. Até que, no domingo (13), o homem decidiu agir e soltar o animal. Ele foi remando em cima de uma prancha até chegar próximo aos animais e, com o remo, conseguiu remover a rede da cabeça da baleia. Em seguida, ela e o filhote mergulharam livres de volta ao mar. A maioria dos comentários de internautas que visualizaram o vídeo é de elogios à iniciativa do “herói” anônimo. Contudo, para o Ibama, a atitude viola regras e é de extremo risco.
Resposta do Ibama
Questionado sobre o caso pelo iG, por meio de nota, o Ibama afirmou que acompanhou a presença da baleia-franca e seu filhote, de 10 a 13 de julho. O monitoramento foi realizado por meio de drones e observações de campo por equipe especializada, formada por integrantes do Ibama e de outras instituições habilitadas em protocolos internacionais de desenredamento de grandes cetáceos.
Segundo o Ibama, durante a ação, foi identificada uma rede de pesca presa superficialmente às calosidades da cabeça da baleia-mãe e, após avaliação técnica, constatou-se que o enrosco não causava ferimentos, não interferia na amamentação do filhote nem em outras atividades naturais do animal e não apresentava risco imediato à sua saúde.
“Diante dessa avaliação e conforme os protocolos técnicos adotados internacionalmente, a recomendação em casos como esse – especialmente envolvendo fêmeas com filhotes – é não realizar intervenção imediata, uma vez que qualquer aproximação indevida pode causar estresse elevado à baleia, prejudicar a relação materno-filial e comprometer a sobrevivência de ambos os animais”.
Protocolos e riscos
Ainda conforme a nota, o protocolo seguido pelo Ibama é o da Rede Global de Desenredamento de Mamíferos Marinhos (Global Whale Entanglement Response Network), a qual é coordenada principalmente pela Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA, na sigla em inglês) e respaldada por entidades como a International Whaling Commission (IWC).
Além disso, reforça o Ibama, a conduta visou a integridade física das pessoas envolvidas, pois baleias são animais de grande porte e comportamento imprevisível, especialmente quando acompanhadas de filhotes. “Tentativas de aproximação ou manipulação sem a devida capacitação técnica podem colocar em risco a vida do próprio indivíduo”, conforme ressalta a nota.
Casos anteriores e fiscalização
O Ibama acrescenta ainda que essa situação não é inédita em Santa Catarina. Em 2020, um caso semelhante foi registrado no estado, quando uma baleia-franca com filhote foi avistada com um material de pesca preso à cabeça. “Naquela ocasião, as instituições responsáveis adotaram o mesmo protocolo de não intervenção, diante dos riscos que a aproximação humana poderia representar para a baleia e seu filhote. O material acabou se desprendendo de forma natural, sem causar prejuízos à saúde dos animais”.
A respeito da ação do homem, no último domingo, o órgão disse que, mesmo após as orientações das equipes do Ibama para que não houvesse aproximação, a ação foi realizada em desacordo com a Portaria Conjunta nº 03/2024 do Ministério do Meio Ambiente e Mudança de Clima, do Ibama e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que regulamenta os procedimentos de desenredamento de grandes cetáceos no Brasil. Esse tipo de conduta, continua a nota, além de contrariar as normas e protocolos estabelecidos, representa um grave risco, tanto para os animais – especialmente durante o período de amamentação – quanto para as pessoas, podendo ainda incentivar comportamentos imprudentes por parte de outros indivíduos. “O Ibama está apurando se a intervenção não autorizada causou algum prejuízo à baleia ou ao seu filhote”, enfatiza.
Conclusão
Por fim, o Ibama reforça que acompanhou o caso da baleia-franca e seu filhote desde o início, “de forma contínua e responsável, com base em critérios técnicos e no compromisso com o bem-estar da fauna marinha”. “Desinformação e sensacionalismo em redes sociais podem distorcer os fatos, gerar interpretações equivocadas e comprometer ações técnicas corretamente conduzidas”, conclui.
Essa é a mesma opinião da bióloga Claudia Bethlem, especialista em baleias que atua em pesquisas científicas no Proantar, o Programa Antártico Brasileiro. Segundo ela, o Ibama está correto ao seguir os protocolos estabelecidos nesse tipo de situação. “O comportamento materno das baleias-franca pode incluir reações defensivas quando percebem uma ameaça ao filhote. Já houve registros de situações em que esse tipo de interação resultou em comportamentos agressivos por parte da mãe. Neste caso, o rapaz teve sorte”, reforça.