Queixada reaparece após mais de 80 anos na região serrana
04/07/2025, 04:34:23Redescoberta dos Queixadas
Os queixadas, porcos selvagens da família Tayassu pecari, voltaram a ser vistos na região serrana do Rio de Janeiro, após mais de 80 anos. Bandos foram documentados na Reserva Biológica Estadual (Rebio) de Araras, em Petrópolis. Considerado extinto localmente, a espécie de porco selvagem nativo do Brasil, ameaçada em todo país devido ao desmatamento e à caça, foi redescoberta entre os municípios de Petrópolis e Miguel Pereira. A Rebio de Araras fica a menos de 25 quilômetros do Parque Nacional da Serra dos Órgãos, onde estudos anteriores apontavam a extinção local dos queixadas.
Monitoramento e Presença Confirmada
As primeiras imagens de um grupo da espécie, por meio de armadilhas fotográficas, foram capturadas em 2021 e monitoradas ao longo de três anos. Em 2022, teve início um monitoramento sistemático, liderado pela pesquisadora e guarda-parque do Inea-RJ, Vanessa Cabral Barbosa, em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Com armadilhas fotográficas instaladas em pontos estratégicos da unidade de conservação estadual, foi possível confirmar a presença dos queixadas em diversos pontos da reserva de Araras e em áreas adjacentes.
Dados Populacionais
Foram documentados bandos compostos por 20 a 60 indivíduos; segundo os especialistas, a média da espécie é de 50 a 150 indivíduos por grupo, dependendo da qualidade e tamanho do habitat. O levantamento foi publicado em artigo na Revista Científica "Suiform Soundings", da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN). “A redescoberta do queixada na Reserva Biológica Estadual de Araras representa um marco significativo para a conservação da biodiversidade na Mata Atlântica, especialmente diante do histórico de declínio populacional da espécie na região”, comemoram os pesquisadores em trecho do artigo.
A Importância dos Corredores Ecológicos
Ainda de acordo com outro trecho do artigo, a redescoberta da espécie na Reserva Biológica de Araras ressalta a importância dos corredores ecológicos e da conectividade florestal para a recolonização e manutenção de populações viáveis na Serra do Mar. A reserva é vizinha de outras quatro unidades de conservação de proteção integral – o Parque Nacional da Serra dos Órgãos, a Reserva Biológica Tinguá, o Monumento Natural Estadual da Serra da Maria Comprida e o Refúgio de Vida Silvestre Estadual da Serra da Estrela.
Desafios à Conservação
O artigo ressalta, no entanto, as pressões que ameaçam os objetivos de conservação da reserva, como a caça, especulação imobiliária e incêndios florestais. O monitoramento de mamíferos de médio e grande porte na Reserva Biológica Estadual de Araras também registrou uma maior densidade de catetos (Pecari tajacu) do que anteriormente estimada, o que pode indicar uma adaptação da espécie aos ambientes fragmentados. Tanto o queixada quanto o cateto são ótimos dispersores de sementes e espécies-chave para manutenção das florestas.
A Rebio de Araras e a Biodiversidade
Criada em 1977, a Rebio de Araras protege cerca de 3,8 mil hectares de remanescentes da Mata Atlântica. Por lá já foram documentadas outras espécies de mamíferos como a jaguatirica (Leopardus pardalis), a onça-parda (Puma concolor) e o ameaçado bugio-ruivo (Alouatta guariba).
O Futuro dos Queixadas
Os pesquisadores reforçam que a sobrevivência das populações de queixada na região depende da implementação de estratégias eficazes para o combate à caça, assim como para restauração de habitats e ampliação dos corredores ecológicos. “A integração entre pesquisa científica e gestão ambiental é essencial para garantir a longo prazo a preservação dessa espécie-chave e dos processos ecológicos associados à sua presença na Mata Atlântica”, resumem os autores.
Contexto da Espécie
Antes da redescoberta dos queixadas na região serrana, a espécie só era conhecida em uma outra unidade de conservação no estado do Rio: o Parque Nacional do Itatiaia, na divisa com Minas Gerais e São Paulo, a mais de 120 quilômetros de distância em linha reta da Rebio de Araras. Embora esteja presente em todos os biomas brasileiros e ocorra amplamente no país, o queixada é classificado nacionalmente como Vulnerável ao risco de extinção.
Avaliações Recentes
De acordo com a mais recente avaliação feita pelo ICMBio, disponível na plataforma Salve, na Mata Atlântica foram identificadas populations de queixada em apenas 31,37% da área de remanescentes do bioma, com um total estimado de menos de 24 mil animais. Na Mata Atlântica do nordeste, por exemplo, a espécie já estaria extinta. Em outros biomas, os queixadas também enfrentam a ameaça do desmatamento e fragmentação do seu habitat. E mesmo na Amazônia, onde a espécie possui maiores chances de sobrevivência, a caça em excesso tem causado extinções locais significativas, alerta a avaliação do ICMBio.
Na última avaliação estadual do estado de conservação das espécies da fauna, feita em 1998, o queixada já era considerado como Em Perigo de extinção no Rio de Janeiro.