Novo diretor financeiro do Corinthians vê "desafio gigante pela frente" e detalha pendências do clube

Novo diretor financeiro do Corinthians vê "desafio gigante pela frente" e detalha pendências do clube
Rozallah Santoro foi o escolhido para ser o diretor financeiro do Corinthians na gestão de Augusto Melo, que se iniciará oficialmente no dia 2 de janeiro. Em entrevista exclusiva à Gazeta Esportiva, o profissional falou sobre a situação das finanças do clube e projetou um "desafio gigante pela frente".
O período do Corinthians é de transição de gestão. Aos poucos, a diretoria chefiada por Augusto vai entendendo o cenário deixado por Duilio Monteiro Alves e companhia. Em relação às finanças, Rozallah não se surpreendeu com o que encontrou, mas consolidou ainda mais a ideia de que não será simples montar uma equipe competitiva com uma dívida que beira a casa do R$ 1,6 bilhão, incluindo a pendência da Neo Química Arena.
"O Corinthians vive uma situação bastante dura de caixa. É um clube bastante endividado, que tem, em que pese o resultado operacional positivo, seus problemas para financiar seu caixa no dia a dia. Vamos encontrar uma situação que, assim, não tem nenhuma surpresa. Encontrei o que esperava encontrar. O que esperava encontrar não era o que via nas apresentações nas reuniões do Conselho. Tinha um viés, que foi confirmado, de que a gente tem um desafio gigante pela frente e que vamos encontrar uma dívida que vai comprometer nossa capacidade de montar um time muito mais competitivo", comentou Rozallah à reportagem.
O Corinthians deve fechar o ano com R$ 850 milhões de dívida, sem considerar a pendência de R$ 700 milhões do Timão com a Caixa Econômica Federal, referente ao pagamento da Neo Química Arena. O que mais atrapalha o fluxo de caixa do clube são as despesas a curto prazo (cerca de R$ 400 milhõs), que enforcam o fluxo de caixa da agremiação.
"A gente acabou de fazer uma renegociação grande de impostos. Se somarmos essa renegociação que foi feita com o Profut, que já tínhamos feito quase 10 anos atrás, estamos falando de R$ 550 milhões só de impostos. Somado isso à Arena, temos R$ 1,25 bilhão que já perdemos de vista. Dentro dessa realidade, buscamos como premissa para 2024 não fazer nenhum tipo de alteração do que era o orçamento de futebol do ano passado", disse o diretor financeiro.
Augusto Melo já disse em mais de uma oportunidade que sua ideia é contratar cerca de 11 jogadores para a temporada de 2024. Para quem vê de fora, o plano parece audacioso para um clube com o caixa tão prejudicado, como é o caso do Corinthians. Rozallah reconhece que o grande desafio da gestão será conciliar saúde financeira com futebol competitivo, e explicou à reportagem quais estratégias podem ser adotadas para executar a árdua tarefa.
"Em 2023, tivemos uma situação em que fomos a quarta maior folha salarial do país. E se olharmos quem chegou na última rodada do Brasileiro com chance de título, tínhamos primeira folha, segunda folha, terceira folha e o intruso ali era o Grêmio, que de fato foi mais eficiente na gestão de verba que tinha disponível. O Corinthians tem hoje jogadores emprestados que pagamos salário, e esses contratos vencem ao final do ano e não serão renovados. Já tivemos saídas de Renato, Gil, Giuliano, Cantillo e Fàbio Santos. Se somarmos tudo isso, temos espaço na folha de R$ 6 milhões por mês. É dentro desse espaço o desafio do futebol de encaixar essas peças de reposição", comentou.
Durante a gestão de Duilio, o clube realizou majoritariamente contratações por empréstimo ou de jogadores sem contrato, com o Corinthians tendo que arcar "apenas" com salários, direitos de imagem, luvas etc. O grande investimento realizado no último triênio foi por Fausto Vera, quando o Timão topou pagar US$ 8 milhões (R$ 43 milhões na cotação de julho de 2022) ao Argentinos Juniors.
"Esse é um caminho bastante razoável, mas temos que ter cuidado pois nada é de graça no futebol. Você incorpora custos na mensalidade, depois você tem que encaixar aquilo no orçamento mensal. Mas o caminho, sem dúvida, além da questão de utilizar bem esse recurso, é que você tem a questão de eventualmente propor alguma troca de jogadores com outro time. Já se falou eventualmente de trocas com Flamengo, Cuiabá… São coisas que venho escutando de fora", opinou Rozallah.
Dois temas vêm ganhando protagonismo no noticiário do Corinthians nos últimos dias: a negociação por Gabigol e a venda de Gabriel Moscardo ao Paris Saint-Germain. Se por um lado trazer um atacante com um dos maiores salários do país obrigaria o clube a achar soluções financeiras, a transferência do Filho do Terrão traz certo alívio para o fluxo de caixa da agremiação.
A multa de Gabigol com o Flamengo está avaliada em 33 milhões de euros (R$ 177 milhões), o que dificulta a missão do Corinthians em contar com o jogador para 2024. Mesmo assim a nova diretoria do Timão agendou uma reunião com a cúpula rubro-negra e espera costurar um acordo para ter o atleta no Parque São Jorge.
"A gestão financeira sempre trabalha com alternativas. Se de fato for uma decisão do presidente trazer um jogador do calibre do Gabigol, com esse custo, vamos ter que escolher o que não pagaremos em outras linhas. É questão de remanejar. Entendi que vamos ter investidores com disposição de participar desse tipo de negócio… Entrando receita nova, a gente vai buscar compor e obviamente no final do dia essas coisas precisam ser compensadas. Temos um desafio de entender o que tem na mesa, o que temos disponível, e entender que cobrir um lado vai ser descobrir o outro", disse o diretor que se formou em engenharia química nas USP (Universidade de Sâo Paulo).
Em relação à venda de Moscardo, o valor de sua transferência para o Paris Sainr-Germain deve girar na casa dos 22 milhões de euros (cerca de R$ 118 milhões). O Timão possui 80% dos direitos econômicos do atleta, que tem o desejo de atuar no Velho Continente.
"Financeiramente… Se os valores que foram falados se confirmarem, a parte do Corinthians deve ser na casa dos R$ 90 a 100 milhões. Esse dinheiro é super bem-vindo para compromissos de curtíssimo prazo, com parcelas atrasadas, valores atrasados de obrigações. Espero poder usar esse valor para dar uma suavizada no caixa", comentou Santoro.
Vocês temem um transfer ban por conta da dívida com o Argentinos Juniors pelo Fausto?
"Está no planejamento (resolver essa pendência). Não é uma preocupação que a gente tem."
Você tem alguma atualização do possível novo acordo entre Corinthians e Caixa?
"Não tive nenhuma novidade do que sabia antes da eleição. Sei que o que foi proposto tem uma composição de R$ 350 milhões dos Naming Rights mais R$ 350 milhões de obrigações do tesouro nacional que a Caixa faz a gestão, e seriam corrigidos no mercado com deságio. Até onde sei, esse acordo estava protocolado pela Caixa em Brasília, já havia passado pelos comitês da Caixa e estava esperando aprovação de outros órgãos, como TGU e TCU".
Se sair do papel, esse será um bom acordo para o clube?
"É um bom acordo para o clube. A gente torce para que ele se concretize, que isso de fato aconteça, seria um mérito da gestão atual."
Caso o novo acordo com a Caixa não seja firmado, a ideia é manter o atual?
"Não só esse. A primeira coisa é: se a gente pensar nas duas coisas, tanto a Caixa como impostos, se for buscar dinheiro no mercado, seja qual for a operação, para substituir esse credor, dificilmente vou encontrar dinheiro mais barato do que isso. Nos 20 anos da Caixa, temos uma taxa de atualização que é o CDI+2% ao ano. Se for pegar dinheiro emprestado do mercado, ou buscar um sócio, vai custar mais caro que o CDI+2%. Para os impostos são as mesmas coisas. Tem lá R$ 250 milhões para 12 anos e tem um reajuste menor. Os impostos são reajustados com o Selic, e no mercado não acho nada melhor do que o Selic. O grande desafio é incorporar esse discurso no nosso dia a dia, com que ele faça parte da nossa constância de pagamentos. Tenho sim interesse, intenção, se não chegar a um acordo com a Caixa, de seguir honrando esse que está aí".
Ampliação da Arena
"Essa grande ampliação é condicionada à existência desse parceiro que queira explorar, ativar isso em torno de impacto de marca. Alguma outra iniciativa ou ativação comercial junto à torcida do Corinthians. É uma questão de quando e se. Quando e se vamos ter esse investidor, esse acordo de valores, aí falamos de uma grande ampliação.
O objetivo da proposta de ampliação recente é aumentar a capacidade de lugares populares, você muda o índice de receita da Arena como é hoje. Hoje temos, por exemplo, pouca venda de Oeste Superior, talvez tenhamos que pensar em um modelo para ocupar a Oeste Superior, sem precisar aumentar a Oeste Inferior, sem mexer na Leste, mantendo nosso ticket médio. É uma questão de equilíbrio. A gente só vai perder receita porque os cornes, tanto da Leste como da Oeste, ficam comprometidos, e abrem espaço para lugares populares. Mas isso depende de corpo de bombeiros… A área que temos hoje na Norte, salvo engano, poderíamos ter mais gente lá. Mas ela tem uma limitação imposta pelos bombeiros por conta do acesso, da entrada e saída de torcedores. Teríamos que ver se não daria para viabilizar um novo acesso. Mas é questão de precificação, se conseguiremos chegar a um denominador comum e levar para o Augusto."
Vocês estão buscando parceiros comerciais visando novas receitas para o clube?
"Não tenha dúvida que todo orçamento vai ser desenhado com uma composição de receita. Teremos uma busca incessante por diminuição de custo e aumento de receita. Lógico que pode parecer uma frase simplória, mas levada a cabo resulta em mais dinheiro para a gente matar pendência. Lógico que não temos interesse nenhum de alongar nossa dívida de curtíssimo prazo. Isso leva a judicialização, custo de processo, multa, juro… Só potencializa o problema. Nome de parceiros novos não tenho para te passar. Mas sei que Sergio Moura (diretor de marketing) está conversando com muita gente".
Como está a pendência do clube com os jogadores?
"Isso está mapeado para ser resolvido agora no início do ano. Tem uma parcela de 13º que vai ser paga com premiação, que vamos receber da CBF agora. E temos uma parcela atrasada de imagem que deve ser quitada nas primeiras semanas de janeiro com antecipação de valores que temos a receber."
Em quanto tempo o Corinthians voltará a ser saudável financeiramente?
"O que é saudável? Quando você pensa em uma empresa, ela tem um resultado operacional. Basicamente o que você tem de receita, menos de despesa, antes de pagar amortização, juros… impostos e tal. E aí, quando você olha esse valor do Corinthians hoje, é na casa de R$ 200 milhões por ano. O que é uma dívida saudável? Do ponto de vista de balanço, uma dívida saudável é duas vezes esse valor. Uma dívida saudável do Corinthians é de R$ 400 milhões e nós temos basicamente quatro vezes mais.
Precisamos reduzir um quarto dela. Estamos falando de R$ 1,2 bilhão. Se a gente conseguir atacar o curto prazo, se a gente conseguir fazer as 'contas a pagar' serem iguais às 'contas a receber', o dinheiro gasto ser igual ao dinheiro que recebo, nisso vou estar zerando meu sufoco. Essa condição, imagino que a gente consiga entregar no final do mandato. Não tenho hoje nenhuma pressa de trocar o longo prazo, o R$ 1,25 bilhão, não tenho pressa porque não tem dinheiro mais barato do que aquele. No primeiro mandato, encaramos o problema de curto prazo. Qualquer que seja o próximo presidente do Corinthians, ele vai pegar um clube com menos sufoco de caixa e vai ter condição de fazer um trabalho de amortização antecipada da dívida, podendo investir no futebol e antecipar os vencimentos, quem sabe consegue desconto para isso. Mas para sair do R$ 1,6 bilhão para chegar nos R$ 400 milhões é algo em torno de seis a nove anos. Teríamos esse mandato, mais dois presidentes pela frente, se não houver mudança de rota e se a gente acertar bastante, mais do que errar".